Classicismo

Carolina Marcello
Carolina Marcello
Mestre em Estudos Literários, Culturais e Interartes

O Classicismo foi um movimento cultural, literário e artístico que vigorou na Europa entre os séculos XV e XVI, ou seja, durante o Renascimento. Com origem na Itália, suas influências começaram a se espalhar para outras regiões do continente, como França e Portugal, por exemplo.

Trata-se de um momento de redescoberta e valorização das obras da Antiguidade Clássica. As criações artísticas greco-latinas tornaram-se a norma, definindo parâmetros formais e temáticos que deveriam ser seguidos.

Importa compreender que o objetivo não era apenas copiar estes modelos, mas utilizá-los como formas de encontrar aquilo que consideravam ser a perfeição estética e ética do passado.

Pintura Escola de Atenas, de Rafael Sanzio.
A pintura "Escola de Atenas" (1509-1510) de Rafael Sanzio é um dos exemplos mais significativos da arte desta época.

No Classicismo, a cultura já não estava apenas ao serviço dos valores e temas religiosos. O Renascimento trouxe uma mudança significativa no pensamento filosófico, colocando o ser humano no centro de todas as coisas.

Isso se refletiu na arte e na literatura, que passaram a valorizar a racionalidade, a evolução e a natureza humana. Assim, a obra valia por si mesma e seu foco era, sobretudo, a beleza. No entanto, ela também deveria inspirar e transmitir ensinamentos.

Confira, abaixo, o mapa mental:

Mapa mental do Classicismo.

Características do Classicismo

  • Proporção, ordem, equilíbrio, rigor, harmonia e simetria;
  • Retorno aos temas clássicos e à mitologia pagã;
  • Utilização das formas clássicas como a dramaturgia e a poesia épica;
  • Valorização da objetividade e da verossimilhança: a obra de arte imita a natureza e deve reproduzir a ordem universal;
  • Racionalidade acima da subjetividade;
  • Foco em temas e experiências transversais à condição humana;
  • Separação das artes: cada uma obedece a um determinado conjunto de preceitos;
  • Obras com moralidade, que ensinam e transmitem valores;
  • Clareza da linguagem;
  • Beleza idealizada e neoplatonismo;
  • Nas artes visuais, predomina a luminosidade, os cenários diurnos e as cores fortes;
  • Na poesia, impera o “doce estilo novo” (medida nova), por oposição às redondilhas de 5 ou 7 sílabas métricas (medida velha).

Contexto histórico do Classicismo

O Classicismo surgiu numa fase de enormes transformações sociais, políticas, culturais e econômicas: o Renascimento, que vigorou entre os séculos XIV e XVI.

Marcando o período de transição entre a Idade Média e a Idade Moderna, o Renascimento foi um movimento cultural, filosófico e científico que despontou na Itália e se espalhou pela Europa.

Entre outras grandes mudanças, trouxe um menor domínio da Igreja Católica sob as práticas, as decisões e as produções culturais. Até aí, a figura de Deus estava no centro de tudo.

Assim, o Teocentrismo deu lugar ao Antropocentrismo, colocando o Homem como figura principal. O foco passou a estar no conhecimento, com invenções e teorias científicas que vieram revolucionar os modos de pensar, viver e criar.

Com as navegações, expansões e trocas comerciais, alguns territórios europeus enriqueceram, proporcionando maiores condições para o intercâmbio cultural, a aprendizagem e a criação.

Além disso, o desenvolvimento urbano trouxe a ascensão da burguesia, tornando-se um terreno fértil para as artes e as letras, com mecenas dispostos a patrocinar as manifestações artísticas.

Ainda antes desse período, alguns precursores (como Petrarca) começaram a se interessar pelas línguas clássicas e a estudar manuscritos gregos e romanos.

Esses conhecimentos e ideais greco-latinos acabaram sendo transportados para a época, alterando profundamente o panorama cultural, artístico e filosófico com seus preceitos.

Classicismo na Literatura

A literatura do Classicismo tomou como inspiração os grandes autores da Antiguidade Clássica, como Homero, Virgílio e Ovídeo, entre outros. Buscando a perfeição formal, estas obras valorizavam a harmonia e o equilíbrio, assim como a clareza da linguagem. Existiam modelos, regras e estilos definidos, que precisavam ser seguidos, com formas e métricas rigorosas.

Aqui, a razão era mais forte do que as emoções e, frequentemente, os temas eram universais, como a vida, a morte, o amor e a passagem do tempo. Havia também a procura de uma moralidade que visava ensinar os leitores.

Importa salientar que existia uma grande separação e hierarquização entre os gêneros literários. Por exemplo, na dramaturgia: a tragédia era encarada como um estilo alto, a comédia era um estilo médio e a farsa um estilo baixo.

O italiano Francesco Petrarca foi um precursor do movimento, apontado com um dos criadores e disseminadores do soneto, além de “pai do Humanismo” pelo seu contributo para a redescoberta dos clássicos.

Ainda na Itália, Torquato Tasso se destacou, com a criação de Jerusalém Libertada, uma obra de poesia épica inspirada nos escritos de Virgílio. Na França, temos Pierre de Ronsard que contribuiu largamente para uma renovação da poesia do país, através das influências greco-latinas.

Em Portugal, Camões é o maior nome associado ao movimento e o autor d’Os Lusíadas, a obra de poesia épica que narra as aventuras e desventuras do povo português durante as expansões marítimas.

Classicismo em Portugal (autores e obras)

O movimento chegou a Portugal em 1527, quando o poeta Francisco de Sá de Miranda regressou ao país, após uma temporada na Itália. De lá, ele trouxe influências renascentistas que acabaram por se difundir na literatura nacional. Considera-se que o Classicismo português terminou em 1580, quando o país passou a estar sob domínio de Espanha.

Na poesia lírica, assistimos a temas universais como o amor, a natureza e a própria condição humana, com grandes questionamentos sobre a moral, a honra e o destino.

Já na poesia épica, existem reflexos e influências dos autores da Antiguidade Clássica, em textos que narram a coragem e as lutas de um povo, refletindo sobre a sua identidade.

Apresentamos, em seguida, os principais autores do Classicismo português:

Francisco Sá de Miranda (1481—1558)

Após uma estadia de cerca de 5 anos na Itália, Sá de Miranda voltou contagiado pelo "doce estilo novo". Responsável por trazer para Portugal os sonetos e versos decassílabos, sua produção literária foi vasta e incluiu odes, éclogas e comédias.

Nos seus poemas, reflete sobre questões morais e filosóficas, incluindo os conflitos que vivia consigo mesmo. Por outro lado, vemos ainda uma forte presença do amor que é idealizado e não carnal (neoplatonismo).

Exemplo de poema de Sá de Miranda:

Quando eu, senhora, em vós os olhos ponho,
e vejo o que não vi nunca, nem cri
que houvesse cá, recolhe-se a alma a si
e vou tresvaliando, como em sonho.

Isto passado, quando me desponho,
e me quero afirmar se foi assi,
pasmado e duvidoso do que vi,
m'espanto às vezes, outras m'avergonho.

Que, tornando ante vós, senhora, tal,
Quando m'era mister tant' outr' ajuda,
de que me valerei, se alma não val?

Esperando por ela que me acuda,
e não me acode, e está cuidando em al,
afronta o coração, a língua é muda.

Luís Vaz de Camões (1524—1580)

Considerado o maior poeta português de todos os tempos, Camões marcou a história da literatura portuguesa e mundial, com obras que continuam sendo lidas e apreciadas atualmente.

Autor de poemas em vários formatos, sua obra-prima foram Os Lusíadas, uma epopeia onde narra as navegações do povo português, contando suas dores e também suas conquistas. Seguindo as estruturas clássicas, o poema é composto por 10 cantos e 1102 estrofes que impressionam pelo seu rigor e perfeição formal.

Trecho do canto V d'Os Lusíadas:

E disse: – Ó gente ousada, mais que quantas
No mundo cometeram grandes cousas,
Tu, que por guerras cruas, tais e tantas,
E por trabalhos vãos nunca repousas,
Pois os vedados términos quebrantas
E navegar meus longos mares ousas,
Que eu tanto tempo há já que guardo e tenho,
Nunca arados d' estranho ou próprio lenho

No trecho citado acima, vemos o Gigante Adamastor confrontando os navegadores lusitanos que tentam passar o famoso "Cabo das Tormentas". A obra transmite o sentimento de nacionalismo, exaltando os feitos heroicos do seu país.

Seguindo os modelos de Homero e Virgílio, conta com a presença de figuras mitológicas que ajudam ou atrapalham os viajantes durante a jornada.

Embora seja lembrado, sobretudo, pela poesia épica, também escreveu centenas de poemas líricos, sobretudo sonetos.

Exemplo de poema lírico de Camões:

Amor é fogo que arde sem se ver,
é ferida que dói, e não se sente;
é um contentamento descontente,
é dor que desatina sem doer.

É um não querer mais que bem querer;
é um andar solitário entre a gente;
é nunca contentar-se de contente;
é um cuidar que ganha em se perder.

É querer estar preso por vontade;
é servir a quem vence, o vencedor;
é ter com quem nos mata, lealdade.

Mas como causar pode seu favor
nos corações humanos amizade,
se tão contrário a si é o mesmo Amor

O poema citado acima é um dos mais célebres do autor, no qual reflete sobre as várias facetas e contrariedades do sentimento amoroso.

Exercícios sobre o Classicismo

1. Quais das seguintes alternativas melhor descreve uma característica principal do Classicismo?

Valorização da subjetividade e do exagero.

Busca pela harmonia, equilíbrio e clareza da linguagem.

Enfoque em temas sobrenaturais e fantásticos.

Utilização de uma linguagem coloquial e informal.

2. O Classicismo valorizava a imitação de quais modelos literários?

Modelos clássicos greco-romanos.

Modelos orientais e exóticos.

Modelos bíblicos e medievais.

Modelos renascentistas italianos.

3. Em que contexto histórico o Classicismo se desenvolveu?

O declínio do Império Romano e a ascensão do feudalismo.

A Revolução Industrial e o crescimento das cidades.

O Renascimento, com a redescoberta dos valores da Antiguidade Clássica.

A Idade Média, marcada pela forte influência da Igreja Católica.

4. Qual das características a seguir é típica da poesia classicista?

Uso de linguagem coloquial.

Exaltação dos sentimentos individuais e subjetivos.

Busca pela perfeição formal.

Descrições detalhadas da vida urbana e industrial.

5. Qual foi a principal obra que marcou o auge do Classicismo em Portugal?

Sermão da Sexagésima de Padre Antônio Vieira

O Guarani de José de Alencar

O Uraguai de Basílio da Gama

Os Lusíadas de Luís de Camões

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Carolina Marcello
Carolina Marcello
Mestre em Estudos Literários, Culturais e Interartes e licenciada em Estudos Portugueses e Lusófonos pela Faculdade de Letras da Universidade do Porto.
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